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Vivian Mara Uhlig
(Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio)

Como foi o início da sua carreira e quais as principais motivações para trabalhar com os anfíbios?

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Minha dedicação ao trabalho com os dados de ocorrência de anfíbios brasileiros é muito recente na minha carreira. Há 8 anos fui, como analista ambiental, removida para o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios - RAN, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, para montar o Núcleo de Geoinformação (NGeo) do RAN, em que me deparei com a primeira etapa da avaliação nacional dos anfíbios acontecendo. Nas avaliações, as espécies até então descritas são criteriosamente analisadas quanto ao seu risco de extinção e eu, apesar de ser bióloga, poucas vezes atuei diretamente com os anfíbios – exceto por coletas em áreas dos Planos de Ação Nacional para as espécies ameaçadas. Meu dia a dia não era com as vocalizações, nem lanternas de campo na testa, nem vidros de amostras... era com mapas, cálculos, remanescentes e compilação de dados de artigos publicados. Minha função era subsidiar com informações georreferenciadas a localização dos registros e a situação do habitat. Os pontos de registro são a base para todo o trabalho do Centro de Pesquisa, pois deles derivam os mapas de distribuição das espécies ameaçadas, as análises de impacto de empreendimentos, os recortes geográficos dos Planos de Ação Nacional para espécies ameaçadas, o embasamento para propostas de unidades de conservação e outras políticas públicas. Para atualizar os registros é necessária uma dedicação minuciosa e acesso a diversos artigos científicos e coleções, além do apoio voluntário dos herpetólogos de diversas instituições. Esse é um trabalho contínuo e ainda existem muitos pontos a serem corrigidos, mas tem sido um útil recurso para as avaliações nacionais, estaduais e regionais, funcionando para o estabelecimento de políticas públicas para a conservação das espécies de anfíbios ameaçados.

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Uma afinidade pessoal já me ligava aos anfíbios desde a infância, quando tive criação de girinos em casa, acompanhava o crescimento e reconhecia algumas vocalizações nos diferentes locais que visitava com a família no Paraná e Santa Catarina. Meus pais sempre nos levavam para visitar parques e reservas particulares em que os anfíbios acabavam se destacando na floresta atlântica. Em coletas de campo de Planos de Ação Nacional substituí colegas do RAN e na primeira coleta, fui orientada pela Juliane Petry e Estevão Comitti, que me ensinaram a encontrar os anfíbios de córregos de Santa Catarina e de montanha, até que encontrei um indivíduo jovem na serapilheira de Brachycephalus, o gênero dos menores sapinhos do Brasil! Detectar um adulto já é difícil na floresta! Acredito que essas experiências contribuíram para aumentar o envolvimento com os anfíbios, que não são apenas nomes em latim e coordenadas geográficas para mim!

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​Quais foram as principais conquistas da sua carreira? Qual é o seu trabalho que considera mais importante?

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Poder contribuir por meio da compilação e tratamento de dados que subsidiem pesquisas no Brasil com anfíbios é a maior conquista e satisfação para quem tem Sistemas de Informação Geográfica como ferramenta de trabalho e, além disso, contribuir para a avaliação nacional das espécies de anfíbios, que gera a lista vermelha de espécies ameaçadas. Receber o prêmio Bertha Lutz do ASG foi um grande reconhecimento ao esforço de madrugadas adentro na atualização dos registros de ocorrência das espécies e em mapeamentos que melhor representem a distribuição das espécies e as ameaças aos ambientes em que ocorrem! Outro trabalho em que colaborei também foi reconhecido em premiação por ser o artigo mais acessado na SAJH, em primeiro lugar, em 2016, com a Izabela Barata como primeira autora. O título é “Downscaling the Gap: Protected Areas, Scientific Knowledge and the Conservation of Amphibian Species in Minas Gerais, Southeastern Brazil” e com ele temos percebido como o trabalho com análises de dados de ocorrência de anfíbios e áreas protegidas pode contribuir para direcionar pesquisas e ações de conservação.

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​Quais foram os principais desafios? Ser mulher fez alguma diferença com relação a eles?

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Minha equipe no NGeo ao longo desses anos foi composta na maioria por mulheres, nossos integrantes homens sempre nos respeitaram e interagiram bem, mesmo esses colegas homens sendo usados como alvo para expressar as piadinhas misóginas para o resto da equipe feminina do dia a dia de outros setores. Os principais desafios eram relacionados a questões do governo federal e falta de recursos humanos para atingir as metas do ICMBio de conservação, e ser mulher, trabalhando com equipe em que a maioria é mulher, acredito que fez a diferença no perfil multifuncional que o cérebro feminino proporciona e na quantidade de detalhes que a acurácia feminina detecta, tornando os desafios menos pesados. 

 

Que experiência, dica ou conselho você gostaria de passar para aqueles que estão começando a estudar os anfíbios, principalmente para as mulheres?

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Para quem está começando os campos para estudar os anfíbios saiba identificar os seus limites pessoais e físicos, e tente ir além deles aos poucos, em cada nova experiência. Procure lacunas no estudo dos anfíbios que possam te dar oportunidade de gerar dados inéditos e contribuir para avanços. Esteja atenta aos detalhes e bem equipada sempre, leia muito e converse muito com outras pesquisadoras, temos grandes guerreiras na área de herpetologia em geral no Brasil! Ser mulher e andar no brejo tem que ser tão comum quanto ser homem e andar no brejo...não espere um tratamento especial por você ser mulher, assim como não admita um tratamento inferior por ser mulher!

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Entrevista publicada em Outubro/2018.

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Ir para a próxima entrevista (Yeda Soares de Lucena Bataus).

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