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Michelle Abadie

Doutoranda em Ecologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Bióloga voluntária do Núcleo de Conservação de Anfíbios e Répteis (NuCAR) da ONG Instituto Curicaca

Como foi sua trajetória pessoal para chegar até aqui?

 

Escolhi cursar Biologia por influência de dois professores da escola estadual de ensino médio onde estudei, em Porto Alegre: um professor que lecionava sobre genética e uma professora estagiária (aluna da licenciatura em Ciências Biológicas da UFRGS) que ensinou zoologia para minha turma. Logo que ingressei na graduação, descobri a Herpetologia, mas o que mais me fascinou foram as serpentes. Como o laboratório de Herpetologia da UFRGS estava sempre lotado, no segundo semestre comecei a estagiar voluntariamente no Núcleo de Ofiologia de Porto Alegre (NOPA) da Fundação Zoobotânica do RS, onde fazia a manutenção e extração de veneno de serpentes em cativeiro. No final desse mesmo ano, em 2007, conheci o Prof. Márcio Borges Martins, docente recém concursado do Instituto de Biociências da UFRGS, que me convidou para trabalhar com modelagem de nicho ecológico de anfíbios, no laboratório de Herpetologia. Não era exatamente o grupo taxonômico que eu desejava trabalhar na época, mas era a chance de entrar no laboratório, então, aceitei. Foi aí que os anfíbios ganharam minha admiração! Bastava somente conhecê-los. Ao longo da graduação, desenvolvi pesquisa sobre distribuição das espécies do gênero Melanophryniscus, sempre voluntariamente, mas cada vez mais fascinada pelos sapinhos-de-barriga-vermelha. Para compensar a falta da bolsa de iniciação científica, fazia monitoria de disciplinas. No início de 2010, incentivada pela doutoranda que eu ajudava no laboratório, convencemos o professor Márcio e escrevemos um projeto para a Fundação Grupo Boticário para avaliar o status de conservação de M. admirabilis, já que recentemente havia sido descrita (2006). Nada se sabia sobre sua história natural, e a espécie podia estar correndo risco de se extinguir devido a construção de uma hidrelétrica na única localidade para onde a espécie era conhecida (e ainda é!). Foi minha primeira bolsa de iniciação científica e o início da minha trajetória em conservação.

 

E sua trajetória profissional?

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Ingressei no curso de Ciências Biológicas da UFRGS em 2006. Em 2007, iniciei um estágio voluntário no NOPA (FZB-RS), onde permaneci por dois anos. Em 2008, concomitantemente, ingressei na iniciação científica no laboratório de Herpetologia da UFRGS, sob orientação do Prof. Márcio Borges Martins, onde fiquei até o final da graduação. No laboratório de Herpetologia, comecei a trabalhar com anfíbios anuros, auxiliando uma aluna de doutorado, a Caroline Zank. Nesse período, desenvolvi pesquisa com modelagem de distribuição potencial das espécies do gênero Melanophryniscus (Anura: Bufonidae) da Savana Uruguaia. Em 2010, aprovamos um projeto junto à Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, onde recebi minha primeira bolsa de iniciação científica. Foi quando iniciei o trabalho de pesquisa e conservação do sapinho-admirável-de-barriga-vermelha, Melanophryniscus admirabilis. Meu trabalho de conclusão de curso foi sobre o uso da fotoidentificação como uma alternativa não invasiva para marcação do sapinho-admirável. Durante esse período, em função das questões de conservação da espécie, me aproximei da ONG Instituto Curicaca e, em seguida, criamos o Núcleo de Conservação de Anfíbios e Répteis (NuCAR). Em função disso, ao longo da minha trajetória profissional, venho participando do Plano de Ação Nacional da Herpetofauna do Sul do Brasil. Concluí o curso de graduação em março de 2013, já ingressando no Mestrado Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da UFRGS. Durante o mestrado, desenvolvi pesquisa sobre ecologia populacional e conservação de M. admirabilis, ainda sob orientação do Prof. Márcio Borges Martins. Desde 2016, venho cursando o doutorado no PPG em Ecologia da UFRGS, sob orientação do Prof. Gonçalo Ferraz e co-orientação do Prof. Márcio Borges Martins. Meu projeto segue a linha de conservação da espécie, com foco na dinâmica populacional e na análise do risco de extinção.

 

Conte-nos um pouco sobre as atividades com conservação de anfíbios com as quais você está envolvida.

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Iniciei minhas atividades com conservação de anfíbios em 2010, assim que soubemos que o sapinho-admirável corria o risco de ser extinto: havia um projeto de construção de uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH) a somente 500 metros do sítio reprodutivo da única população conhecida da espécie. Como quase nada se sabia a respeito de M. admirabilis e a espécie havia ficado de fora das listas de fauna ameaçada, iniciamos um projeto para avaliar o status de ameaça, a partir da busca por novas populações, estimativa de abundância da população conhecida e identificação de ameaças reais e potenciais. Após ser avaliada como Criticamente Em Perigo de Extinção, e conseguirmos cancelar a licença da PCH, direcionamos o foco do nosso trabalho com o sapinho-admirável para a redução das ameaças identificadas, como a perda de hábitat devido à monocultura de fumo e criação de gado, principalmente. Atualmente sou responsável técnica de um projeto financiado pela Fundação Grupo Boticário, que objetiva desenhar uma unidade de conservação para M. admirabilis e seus microhábitat associados. Além disso, desde 2011 participo como articuladora ou colaboradora do Plano de Ação Nacional da Herpetofauna do Sul do Brasil, tanto em ações relacionadas a M. admirabilis, como em outras ações mais gerais de conservação de anfíbios e répteis, atuando como membro do NuCAR do Instituto Curicaca.

 

Quais são suas visões de conservação e como você pretende colaborar para torná-las realidade?

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Acredito que a conservação da natureza somente seja possível a partir da educação. Se não houver uma conscientização sistematizada, ações individuais, apesar de importantes, não resolvem o problema. Nesse sentido, minha primeira fonte de colaboração é a partir da produção de conhecimento para subsidiar a construção de planos de manejo, planos de ação e projetos de educação ambiental. Porém, somente a produção intelectual não dá o retorno que eu espero como conservacionista. A atuação junto a ONGs ou em projetos de extensão é fundamental para a aplicação do conhecimento gerado, podendo influenciar na criação de políticas públicas para a conservação dos ambientes onde vivem as espécies de anfíbios (ou de outros grupos). Acredito que somente a conscientização ambiental, sobretudo envolvendo comunidades locais, seja capaz de provocar a mudança de pensamento e de hábitos necessária, como por exemplo a redução do consumo, a redução da produção de lixo, a valorização das culturas locais e do alimento orgânico, e o incentivo ao consumo de produtos provenientes de espécies de plantas nativas.

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Entrevista publicada em Outubro/2018.

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Ir para a próxima entrevista (Renata Ibelli Vaz).

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