top of page
denise.jpg
Denise de Cerqueira Rossa Feres (Universidade Estadual Paulista–São José do Rio Preto)

Como foi o início da sua carreira e quais as principais motivações para trabalhar com os anfíbios?

 

Eu sempre gostei de estar no mato: floresta, cerrado, campo. Então, quando comecei a pensar em estágio, procurei um orientador que fizesse trabalho de campo, e esse orientador (Prof. Dr. Jorge Jim) trabalhava com anfíbios. Logo na primeira saída a campo achei os sapinhos incríveis, cada espécie ter seu canto, a dificuldade para localizá-los a noite, isso me desafiou e eu adoro desafios. Além disso, o Prof. Jim era um filósofo nato e foi um grande mestre Zen. A sensibilidade dele em campo era espantosa! E era maravilhoso aprender tanta coisa sobre comportamento, evolução e filosofia da ciência com ele durante os trabalhos de campo. Mas quando decidi fazer o mestrado, o Prof. Jim me encaminhou para o curso de Ecologia (minha formação na iniciação cientifica tinha sido em sistemática), e propôs que eu desenvolvesse um projeto com girinos, fiquei furiosa!! Sempre fui feminista e achei que isso era o maior machismo dele!

​

- Só porque sou mulher não podia trabalhar com sistemática?!!

- Só porque sou mulher tinha que trabalhar com Ecologia?!!

- Só porque sou mulher não podia trabalhar com adultos? Tinha que trabalhar com larvas?!!!

​

Entretanto, esse sentimento durou só até a primeira saída a campo para coletar girinos e só até a primeira aula no PPG Ecologia da UNICAMP. Só então percebi que não havia nada de machismo nessa orientação dele! Coletar girinos exige força, vem muito detrito e vegetação na peneira que fica bem pesada. Andar dentro da lagoa, no sol da tarde ou no frio de Botucatu, atolando e peneirando, não tinha nada de machismo. E, na primeira aula na Pós-graduação em Ecologia (do Prof. Woodruff Benson), eu entendi que era isso que eu queria fazer o resto da minha vida! O trabalho forte no campo, os girinos e a ecologia!

 

Quais foram as principais conquistas da sua carreira? Qual é o seu trabalho que considera mais importante?

​

Considero minha principal conquista a concepção, proposição e aprovação da proposta do PPG em Biologia Animal, na UNESP – Rio Preto. Esse PPG teve um desenvolvimento incrível, subindo de conceito a cada avaliação e, atualmente, temos a nota máxima (7) na CAPES. Esse PPG possibilitou maior união e um grande desenvolvimento do nosso Departamento e do Instituto e, principalmente, possibilitou uma carreira para muitos ex-alunos, hoje colegas em diversas Universidades do Brasil. O trabalho mais importante é difícil. Considero tudo importante! Formar alunos na Graduação que, mesmo seguindo outras áreas, tivessem boa formação em ecologia, sempre foi prioridade! Mas destaco aqui a coordenação do Projeto SISBIOTA Girinos do Brasil, ao mesmo tempo um grande desafio (22 docentes de 15 Universidades de 11 estados brasileiros) e um imenso prazer! Esse edital foi uma proposta incrível, por possibilitar a formação de redes de pesquisa nacionais, e teria continuado e avançado com a institucionalização de bancos de dados validados e integrados. Isso seria um salto qualitativo imenso para as pesquisas em biodiversidade no país. Não consigo qualificar a grande perda, o atraso que a ciência brasileira sofreu com essa crise política, que reduziu absurdamente as verbas para pesquisa e está desmontando o país.

 

Quais foram os principais desafios? Ser mulher fez alguma diferença com relação a eles?

​

Ser mulher fez pouca diferença. Só depois de muitos anos, percebi que não fui incluída em umas duas expedições científicas por ser mulher. Ser mãe fez diferença! Foi bastante difícil conciliar a carreira com a maternidade. Eu não pude ter licença maternidade, comecei a trabalhar quando minha filha tinha 16 dias de vida. Não havia creche na Universidade, nem qualquer outro tipo de apoio. Por isso, defendo que deve haver apoio institucional para quando a mulher se torna mãe (biológica ou adotiva), inclusive isso deve ser considerado nos prazos de bolsa e financiamento a projetos.

 

Que experiência, dica ou conselho você gostaria de passar para aqueles que estão começando a estudar os anfíbios, principalmente para as mulheres?

​

Não acreditem em limites! Não há diferença entre homens e mulheres na capacidade e habilidade para trabalhos de campo, de laboratório, intelectual etc. As diferenças que existem são entre pessoas diferentes, não são relacionadas a sexo. Então, respeite sua vocação natural e faça o que lhe dá prazer. Nesses tempos tão conturbados e imprevisíveis, acredito que essa é a única garantia de ser feliz na profissão.

​​

Entrevista publicada em Outubro/2018.

​

Ir para a próxima entrevista (Flora Acuña Juncá).

bottom of page